Meu nome é Nelson Alves ou melhor, nelves, como sou conhecido, brasileiro, nasci numa pequena cidade no interior do estado de São Paulo, Rancharia, onde passei a infância, adolescência e iniciei minha vida profissional dando aulas de noções de desenho para principiantes e fazendo meus primeiros desenhos a lápis de grafite. O desenho sempre esteve presente na minha vida.

Convidado, cheguei a São Paulo, no início da década de 70, para ilustrar rostos de jogadores de futebol numa edição especial da revista Placar na Editora Abril! O que seria um trabalho temporário acabou sendo definitivo e fiquei por mais de duas décadas na casa, o que me propiciou, como jornalista, conhecer o mundo da ilustração, artes gráficas e computação! Como ilustrador, trabalhei para agências de publicidade e editoras de todo o país, com as mais variadas técnicas desde aerógrafo, lápis de grafite, guache, acrílico, aquarela, pastel, entre outras (veja 123).

Como o desenho passou a fazer parte da minha vida


Acho imprescindível contar para você como o desenho entrou na minha vida, como tudo aconteceu, pois pode estar acontecendo algo semelhante com você hoje e servir de incentivo e referência na sua decisão em aprender.

O desenho sempre esteve presente na minha vida, desde a infância, quando aconteceu algo que foi o ponto de partida, o meu primeiro contato com o mundo das artes, ali, inconscientemente, eu decidi o que queria, esta passagem ficou para sempre na minha mente:

Tinha 7 anos, ainda no interior de São Paulo, em Rancharia, Grupo Escolar José Giorgio, no horário do recreio, estava comendo meu lanche e andando pelo espaço onde as crianças corriam, jogavam bola etc, quando notei que um garoto, um pouco mais velho que eu, tinha 10 anos, talvez, estava abaixado de cócoras e rabiscava o chão com o dedo indicador, me aproximei e vi que desenhava, enquanto com a outra mão, segurava um carteira de cigarros vazia (da marca Pullmann, ainda me lembro), achada ali pelo chão, onde estampava o perfil, a traços, de um calhambeque em branco num fundo vermelho, então ele olhava a figura e ia fazendo no chão, na terra, o mesmo desenho. Parei ao seu lado e não contente me abaixei também para ver mais de perto e fiquei ali, maravilhado com a cena, acompanhando e conferindo junto com ele os movimentos com o olhar, ora para o desenho no chão, ora para a figura da carteira de cigarros. Ele se virou momentâneamente, me olhou e, sem se importar, continuou. Quando terminou, ele se levantou e saiu correndo. Eu continuei ali, estático, olhar fixo no chão por um bom tempo, vendo o que ele havia feito, sem entender porque aquilo me chamou tanto a atenção, apanhei a carteira de cigarros que estava ao lado e guardei. No outro dia, na hora do recreio, saí correndo pelo pátio à procura do menino, encontrei-o e pedi a ele que fizesse de novo aquele desenho no chão, ele me atendeu e de novo fiquei lá maravilhado, aquilo me tocava fundo. E essa cena se repetiu por várias vezes, até que, é lógico, ele se encheu daquilo e não aguentava mais me aturar no pé dele.

Desse momento em diante senti um grande interesse em ver alguém desenhando. Achava o máximo, me agradava, me fascinava mesmo ver meu irmão, Irineu, desenhar com traços mal delineados e perspectiva sabe-se lá como, nossas camas junto às paredes, os criados-mudos, os objetos e móveis espalhados pelo modesto quarto. Outra vítima era meu amigo de infância Seiti Yamauti, o Uta, que eu adorava ver desenhar aqueles motivos japoneses, que ele pacientemente os repetia para eu ver.

Os anos se passaram, e então, já com doze ou treze anos, no ginásio hoje, ensino fundamental, durante as aulas de desenho, Dona Ivone incluía nesta matéria o desenho do natural, com o qual, graças a ela, eu realmente constatei minha facilidade e gosto pelo desenho a lápis. Ela posicionava uma xícara de porcelana barata, me lembro bem que imitava uma espiga de milho colorida, num pedestal junto à lousa pra que todos pudessem desenhá-la. Não entendia porque, mas era muito engraçado ver meus colegas mudarem de lugar, dependendo do ângulo que a professora posicionava a tal xícara. Todos queriam avistá-la com a asa inteira para um dos lados, ninguém queria desenhá-la com a asa voltada em sua direção. Eu era o único que não me mexia e conseguia desenhá-la nesta posição ou outra qualquer, de maneira a impressionar Dona Ivone, pois eu conseguia entender e executar, não perfeitamente, mas com alguma noção, o que ela nos passava sobre luz e sombra. Essa era a única matéria que eu sempre tirava dez e não precisava fazer exames finais. Passei, a partir daí, a praticar o desenho ainda sem saber qual técnica me agradava mais, fazendo de tudo um pouco, pedia para parente ou amigo que viajasse para São Paulo, me trazer algum material de desenho, revista, livro, lápis, pincel, tintas etc, qualquer coisa. Reproduzia capas de gibis, geralmente da Disney, com pincéis e tinta, mas comecei a perceber uma preferência por lápis de grafite e quando notei só fazia desenhos a lápis. Me lembro bem de um auto-retrato que fiz olhando no espelho.

Por volta dos meus 16 anos, meu irmão Geraldo, me deu de presente um livro: A Técnica do Desenho, de Jaime Cortez, que tenho até hoje, com muitas feras dos quadrinhos da época, como o próprio Jaime Cortez, Getúlio Delphin, Gutemberg, Igayara, Isomar, José Lancelloti, Maurício de Souza, Nico Rosso, Flávio Colin, Lyrio Aragão entre outros. Minha preferência pelos autores que usavam técnica a lápis fez com que eu reproduzisse várias vezes aqueles desenhos, mas pouco me ajudavam em termos de como usar o material, como fazer.

Mas o fato mais marcante da minha vida como artista e que definiu de vez minha opção pelo lápis aconteceu aos meus 18 anos quando estive por alguns dias em São Paulo, na casa de uma tia e fui até o centro comprar material numa loja chamada Politécnica Paulista, por indicação de alguém, na rua Santa Ifigênia, bem ao lado da igreja, já perto do viaduto. Quando olhei na vitrine comecei a admirar os vários materiais antes de entrar, havia desde lápis a pranchetas, cavaletes etc, quando de repente, mais ao canto, me deparei com uma belíssima imagem da Elisabeth Taylor em preto e branco, com cabelos muito negros, brilhantes e um brinco imitando um cacho de pequeninas flores brancas que, penduradas, se destacavam entre o negro do cabelo e o tom de pele, cheguei mais perto e vi uma assinatura no cantinho: Oliver! Nunca vou me esquecer desse nome! Meu Deus, aquilo era um desenho! Fiquei pasmo, boquiaberto! E, num misto de incredulidade e euforia, disse pra mim mesmo: É assim que eu quero desenhar! E naquele instante decidi que queria ser um Oliver também, vi que era possível fazer desenhos com tanta perfeição.

Entrei na loja, ao obter informações sobre o desenho e o artista, para minha surpresa, a balconista me informou que o atelier dele era nos fundos da loja, mas que estaria lá só no dia seguinte. Nem comprei nada naquele dia. Voltei pra casa da minha tia. Mal consegui dormir esperando pelo dia seguinte.

Cheguei bem cedo e perguntei para a mesma balconista se podia falar com o artista, pois queria comprar material mas queria uma indicação dele. Depois de consultado ele permitiu que eu entrasse. Com passos indecisos, sem saber o que me esperava, encontrei alguém que parecia ter acabado de acordar, com cabelos em completo desalinho e pensei: Será que vou me dar mal?! Se o cara acorda de mau humor, saio correndo. Muito simpático, me recebeu bem e depois de parabenizá-lo pelo trabalho, perguntei se poderia me passar o material usado naquele desenho. Com certeza, não era só o que eu pretendia perguntar, mas fui impedido pela timidez, que me persegue até hoje, e também pelo receio de incomodá-lo. Olhei em volta na esperança de ver algum trabalho em andamento ou algo que pudesse usar como gancho para ajudar a superar a maldita timidez e assim poder perguntar sobre o uso do material, por exemplo. Mas nada. Não vi nada! Ele muito prestativo me indicou todo o material. Agradeci e fui saindo ainda mais indeciso do que entrei, mas contente pela possibilidade de sair dali com todos os ingredientes possíveis para fazer aquela maravilha da vitrine.

De volta ao interior, com o material indicado por ele, o desenho da Elisabeth Taylor na memória e mais de 500 km distante do artista, pronto! E agora? Como faço? Por onde começo?

Olhei para o material, uma caixa de crayons pitt, tipo Conté, sem nenhuma orientação de como usar aquilo, que jamais tinha visto. Mas não me intimidei, arregacei as mangas e fui em frente. Tentei de todas as maneiras, durante meses e meses, consegui resultados satisfatórios, como o desenho do Pelé (veja), mas nada comparado ao que eu tinha em mente como objetivo. Com o tempo, acabei por mesclar crayons com lápis de grafite, para finalmente ficar apenas com os lápis de grafite e trabalhar intensamente até chegar aos resultados de hoje.

Mas, sem dúvida, minha grande paixão sempre foi mesmo o desenho a lápis de grafite.

A busca por infinitos tons de cinza, que podem ser encontrados e trazidos para o papel num centímetro quadrado do desenho, com todos os seus pequeninos detalhes, e por isso levando dias para finalizar um único trabalho, me fascina.

Hoje, estou muito feliz em poder dedicar todo meu tempo a essa paixão, seja executando um retrato por encomenda, seja ensinando, passando minha experiência de anos para quem gosta dessa arte apaixonante. Nada pode ser mais gratificante que acompanhar a satisfação do aluno assimilando meus ensinamentos e evoluindo, como tem acontecido nos últimos anos tanto pela internet quanto presencialmente.